Todo ato de escrita implica, na verdade, o emprego de uma força ou de uma dissonância – que aqui chamamos de elemento. No caso em questão, trata-se de um elemento bruto e de uma força renhida, uma força muito mais de separação do que de reforço do vínculo – uma força de cisão e de real isolamento, aplicada exclusivamente sobre si mesma e que busca se eximir do resto do mundo ao mesmo tempo que almeja, em última instância, assegurar o domínio sobre ele. Na verdade, a reflexão a seguir tem por objeto o retorno da relação de inimizade a uma escala global, assim como suas múltiplas reconfigurações nas condições atuais. O conceito platônico de phármakon – a ideia de um medicamento que atua simultaneamente como remédio e veneno – constitui seu eixo central. Apoiando-se parcialmente na obra política e psiquiátrica de Frantz Fanon, será exposto como, na esteira dos conflitos da descolonização, a guerra (sob a égide da conquista e da ocupação, do terror e da contrainsurgência) se tornou, desde o final do século XX, o sacramento da nossa época.
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